Como cuidamos o “Pôr do Sol”
AUTORA: Susana Maria Filipe Gonçalves
Quando a morte se avizinha, a diferença entre tratar e cuidar acentua-se ainda mais. É é neste período que o nosso doente necessita mais dos nossos cuidados, que saibamos ser, que saibamos estar.
Procuramos proporcionar a máxima qualidade de vida possível, mas esta é uma noção tão subjectiva...
Poderia expor aqui uma série de definições e conceitos para a Qualidade de Vida, da OMS ou de outros autores de renome, mas se me permitem, prefiro pensar nos meus doentes, no que eles me pediram, no que eles me disseram, em como pequenos gestos foram importantes para eles no seu “pôr do sol”. Como diria um colega: “Quem gosta de estar sozinho na derradeira viagem?...” E foi em pequenos e breves momentos de partilha que me senti humana, que me senti enfermeira.
Penso assim que é também nesta postura que nos devemos concentrar na prática clínica, pois é esta sensibilidade que nos distingue e valoriza.
Reconheço que não é fácil conformarmo-nos com a inevitabilidade da morte, porque sentimos que temos que conseguir fazer algo por aquela pessoa, mas cada vez mais a agredimos com intervenções dolorosas e desconfortáveis, e cometemos um dos maiores erros que um profissional de saúde pode cometer: o desrespeito pelo outro. Não se trata de negar a vida, mas sim de compreendermos que esta é finita, tem um princípio, segue o seu curso, e tem um fim.
Sou enfermeira no Hospital de Dia de Quimioterapia no HDFF, e como tal, acompanho a evolução dos doentes desde o primeiro dia em que nos chegam assustados, mas cheios de esperança, até ao fim ... dos tratamentos, ou da sua vida... Partilho com eles e com os seus familiares momentos de medo e de fé, momentos de desespero e outros de coragem, e muitas vezes, também não é fácil para mim... Mesmo que me concentre na realidade dos factos, como não nos vamos afeiçoar a pessoas com as quais convivemos meses e anos? Como conseguimos ignorar os seus pedidos de ajuda, porque se sentem a piorar, a sua condição física a minorar, a perda de apetite, o cansaço fácil, o emagrecimento, as dores a aparecer, e a esperança de cura a esvair-se?! Sinto a dor dos seus familiares, do seu marido ou da sua esposa, dos seus filhos ou dos seus pais, e o porquê?!
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